
Dá o play e comece a ler:
Peguei-te espiando-me pelo canto dos olhos enquanto eu
enrolava teus cabelos com a ponta dos meus dedos. Relutei em admitir. Principalmente
para mim mesma. Relutei por medo. Inúmeros medos. Tantos que mal consigo
contar. Mas prometi para mim mesma que nunca mais reprimiria os sentimentos que
eu pudesse vir a ter. Então olhei-te de volta e disse baixinho que eu estava
apaixonada por você. As janelas do teu quarto estavam abertas e um feixe de luz
acendia a profundidade – que ainda não desvendei por completo – do castanho dos
teus olhos.
Nunca acreditei que conheceria alguém que me preenchesse. Nunca
acreditei nessa história de metade da laranja. Até porque eu já sou uma
laranjeira inteira. Já era tarde da noite quando você me apareceu pela primeira
vez. Eu, que não sabia nem o que iria comer de almoço no dia seguinte, me
deparei com você me perguntando o que eu queria pra minha vida.
“Só vou saber quando encontrar”, respondi.
Você podia ser qualquer pessoa, com qualquer má índole, com
qualquer má intenção. Mas aceitei sair com você uma semana depois. E não tive
medo de parecer vagabunda por me entregar no primeiro encontro. Nem no
terceiro. Nem no sétimo. Décimo. E foram tantos que parei de contar.
Eu jurava desde o início que daríamos errado e que não
passaríamos de um caso de algumas semanas. Tínhamos tudo pra dar errado. Você
não é nada daquilo que eu esperava, e tenho certeza que eu fugi de todas as suas
expectativas, também Eu queria alguém pra se encaixar nos meus sonhos, loucuras
e devaneios. Queria alguém pra fluir comigo e não me dar dor de cabeça.
Você me chegou com um quebra cabeças inteiro por montar, sem
dica nenhuma do qual figura poderia se formar. Não sei se já te contei, mas sou
péssima pra construir coisas. Mas mesmo com tantas diferenças gritantes,
achamos um jeito de nos encaixar. Sou como um furacão. Costumo entrar nas vidas
das pessoas e as bagunçar por inteiro. Mas desconfio que você goste do meu
caos.
Eu que chego a ter ânsia de vômito diante de romantismo, não
consigo conter o sorriso que me toma o rosto inteiro quando você me manda
mensagem do nada só pra dizer que gosta de mim. Você, que se vê como uma casca
oca, chega até a iluminar todo a rua quando te beijo desprevenido. Eu, que te ligo pedindo pra me ver porque aconteceu algo de muito sério, e você que entra em desespero e vem na mesma hora, pra quando chegar, eu poder te beijar e dizer que só queria te ver porque tava com saudade.
E nós dois, com tanta depressão e suicídio em comum, anulamos a dor com felicidade, e rimos por qualquer bobagem.
Dia desses uma amiga me perguntou há quanto tempo
namorávamos. Respondi que não namorávamos, mas estávamos juntos. Ela me olhou
com surpresa, quase pasma, como se eu houvesse acabado de confessar um
assassinato. Ela, indignada, me disse que precisávamos saber o que estávamos fazendo.
E que, sem rótulos, é como se não estivéssemos indo pra lugar nenhum. Não pude
conter o riso.
O que
você vai dizer se alguém perguntar o que ele é seu?
Olhei-a. Respirei. Sorri.
Vou
dizer que ele é meu.
E nos encaixamos de todas as possíveis formas.
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