Café, cigarros e o meu não amor



E então eu acordei. Você estava com os olhos fechados e a respiração tranquila como quem está sonhando com algo bom. Se eu não estivesse ouvindo as batidas do seu coração de tão pertinho, diria que nem vivo você estava. Não morto. Em outra dimensão talvez.
Meus cabelos estavam espalhados pelo travesseiro e minha cabeça apoiada nos seus braços.
Na mesinha do lado tinha um cigarro apagado e um copo de conhaque não terminado. Sua barba também tinha cheiro de cigarro e conhaque. E um terceiro cheiro diferente. Um cheiro de sol da manha. Por falar em barba, pare de fazê-la. Você fica muito melhor com barba. Não gosto da sensação de roçar meu rosto no seu e não ter nada para me pinicar. Seus lábios ficam bonitos com um bigode acima deles. 
A janela estava fechada. O sol não entrava no quarto, apenas iluminava-o. Talvez o terceiro cheiro fosse natural. Você sempre me diz que não sente esse aroma gostoso que o sol deixa quando clareia o dia. E eu já cansei de dizer que não é algo que você chega até seu nariz. É algo que você tem que procurar para sentir. 
Você nunca foi do tipo sensitivo. Seu cérebro grita mais do que o coração. E eu sou muito mais entregue ao mundo. Você tem um medo obcecado de se entregar às coisas. Até agora não consigo entender como se entregou a mim. 
Mas isso não é amor. Ainda não parei pra pensar no que pode ser. 
Amor é quando, mesmo chovendo, você sai correndo na rua pra poder se encontrar comigo. E eu nunca faria isto por você. Mas não me encare mal. Eu adoro quando dividimos o mesmo copo de café e a última bolachinha de maisena. Só não estou com vontade de amar alguém por agora. Talvez nunca. Não sei. Nunca é uma palavra forte demais.
Seus amigos dizem que eu estou mentindo sobre os meus sentimentos por você. Mas eu nunca jurei amor eterno. Nunca jurei sentimento algum. E você, mesmo que não dizendo nada, subentendeu. Talvez tenha reparado pela forma que eu te olho quando você está escovando os dentes.
Eu soube que te queria de alguma forma quando você não se importou em me dar seu último cigarro. Tentamos acendê-lo fazendo fogo com dois gravetos. Estávamos sem fósforos e menos ainda com esqueiros.
Você me chamou pra sair. Eu aceitei. Então dia após dia venho acordando com você no meu lado. Mas não deveria ser assim. Pelo menos, segundo você.
Então eu faço a mesma coisa de sempre. Te dou um beijo enquanto você ainda está em um de seus sonos profundos, me levanto da cama, visto as roupas que jogara no chão na noite passada, bebo seu café. Seus últimos goles de café. Ele está sempre em falta na sua casa. Acho que é por que eu sempre bebo todo o seu estoque. E vou embora. 
Se isto é amor? Não! Está bem longe de ser. Isto é uma coisa muito mais divertida.

2 comentários :

  1. Engraçado como a gente assimila um café quente a um amor, na maioria das vezes né?

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    1. Acho que é por que gostamos do que nos deixa quentinhos por dentro. E ambos nos esquentam. Seja no estomago ou seja no coração.. E na maioria das vezes, ambos esquentam o coração hahaha

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